O álcool pode causar câncer? A resposta dos especialistas
Essa pergunta ainda causa surpresa em muitos: beber álcool pode mesmo causar câncer? A ciência já não deixa dúvidas sobre a resposta — sim, o álcool é um fator de risco comprovado para o desenvolvimento de diversos tipos de câncer, e essa relação se mantém mesmo em consumos considerados moderados.
Durante muito tempo, o álcool foi associado apenas a problemas como cirrose, dependência química e acidentes de trânsito. Mas, nas últimas décadas, estudos internacionais e nacionais vêm apontando algo mais preocupante: o etanol, presente nas bebidas alcoólicas, é uma substância cancerígena.
Esse entendimento já foi consolidado por órgãos como a Agência Internacional para Pesquisa sobre o Câncer (IARC), vinculada à Organização Mundial da Saúde (OMS), que classifica o álcool como carcinógeno do grupo 1, o mais alto nível de evidência científica.
Tipos de câncer mais associados ao álcool
Entre os tipos de câncer mais frequentemente associados ao consumo de bebidas alcoólicas estão os que atingem o trato digestivo superior — como boca, faringe, laringe e esôfago — além do fígado, intestino (especialmente o cólon e o reto) e mama. Segundo dados do Instituto Nacional de Câncer (INCA), o risco aumenta proporcionalmente ao volume e à frequência do consumo. No entanto, a ideia de que pequenas doses são “seguras” também já foi derrubada.
Existe uma dose segura de álcool?
Mesmo consumos considerados baixos, como uma taça de vinho por dia, já estão associados a um aumento do risco de certos tipos de tumor, como o de mama.
Para outros problemas de saúde, como doenças cardiovasculares ou hepáticas, alguns países ainda estabelecem limites — como até uma dose por dia para mulheres e duas para homens, sendo que uma dose equivale a aproximadamente 350 ml de cerveja, 150 ml de vinho ou 45 ml de destilado. No entanto, para o câncer, o consumo ideal é zero.
E o consumo social, faz mal?
Muita gente acredita que beber socialmente — em ocasiões pontuais, como festas ou jantares — não representa risco à saúde. No entanto, do ponto de vista oncológico, qualquer quantidade de álcool já pode ser prejudicial. Essa é a posição de especialistas como o oncologista Dr. Antonio Buzaid, que reforça: “o risco é cumulativo, ou seja, depende da quantidade total ingerida ao longo da vida”.
Essa visão tem ganhado cada vez mais respaldo científico. Um artigo publicado na revista médica The Lancet Oncology defende que não existe um nível seguro de consumo de álcool quando o objetivo é a prevenção do câncer.
O que acontece no corpo quando consumimos álcool
Ao ser ingerido, o álcool é metabolizado no fígado e convertido em acetaldeído, uma substância altamente tóxica e mutagênica. Isso significa que ela é capaz de causar danos ao DNA das células e interferir nos mecanismos naturais de reparação do corpo. É justamente esse processo que pode dar origem ao desenvolvimento de células cancerígenas.
Além disso, o álcool também atua de forma indireta. Ele pode aumentar a inflamação nos tecidos, afetar o funcionamento do sistema imunológico e interferir na absorção de nutrientes protetores, como vitaminas do complexo B, A, C e E.
Por que o álcool afeta o humor e o comportamento?
O álcool atua diretamente no sistema nervoso central, alterando a forma como o cérebro processa informações e regula emoções. Inicialmente, ele pode provocar sensações de relaxamento e euforia, porque reduz a atividade de áreas cerebrais ligadas ao autocontrole e à ansiedade. No entanto, esse efeito é temporário e instável.
Com o aumento do consumo, o álcool começa a deprimir o funcionamento cerebral, podendo causar irritabilidade, tristeza, impulsividade ou até agressividade. Além disso, o uso frequente ou em grandes quantidades pode desequilibrar neurotransmissores como a serotonina e a dopamina, que são fundamentais para o controle do humor, favorecendo quadros de depressão, ansiedade e oscilações emocionais intensas.
Álcool e câncer: riscos para quem já enfrenta a doença
Para pessoas que já foram diagnosticadas com câncer, o consumo de álcool pode agravar significativamente a situação clínica. Além de interferir na eficácia de tratamentos como quimioterapia e radioterapia, o álcool pode comprometer o sistema imunológico e dificultar a recuperação do organismo. Estudos apontam que o álcool também aumenta o risco de recidiva (retorno do câncer) e o surgimento de novos tumores.
Por isso, a recomendação dos oncologistas é clara: pacientes oncológicos devem evitar completamente o consumo de bebidas alcoólicas durante e após o tratamento (ou seja, para sempre), como parte fundamental de uma estratégia de cuidado e prevenção de complicações.
Vale a pena parar de beber?
A boa notícia é que o risco de câncer relacionado ao álcool pode ser reduzido significativamente com a diminuição ou interrupção do consumo. Estudos mostram que pessoas que param de beber reduzem progressivamente suas chances de desenvolver cânceres associados ao álcool, especialmente se essa mudança ocorre antes dos 50 anos (nunca é tarde demais para se iniciarem hábitos novos, principalmente os saudáveis).
Além disso, adotar um estilo de vida saudável — com boa alimentação, prática regular de exercícios e controle do estresse — potencializa ainda mais essa proteção.
Conclusão: o que devemos fazer com essa informação?
Reconhecer o álcool como substância cancerígena não significa necessariamente demonizá-lo, mas sim informar com responsabilidade. Por muito tempo, os riscos foram minimizados ou ignorados. Hoje, a transparência é essencial para que as pessoas façam escolhas conscientes.
Diminuir o consumo — ou eliminá-lo completamente — é uma forma de prevenção eficaz, especialmente diante de uma doença tão complexa e multifatorial como o câncer. Como destaca o Ministério da Saúde, cerca de 4% de todos os casos de câncer no Brasil estão relacionados ao álcool. Saber disso pode ser o primeiro passo para mudar hábitos e cuidar melhor da saúde a longo prazo.
Fontes:
INCA;
OMS;
VEJA.