Autonomia do paciente na oncologia: o novo foco dos cuidados

Paciente com câncer conversando com enfermeiro em uma cama de hospital + subtítulo

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A oncologia vive hoje uma transformação que vai além das terapias inovadoras ou dos avanços tecnológicos. Cada vez mais, o foco está sendo redirecionado para o ser humano por trás do diagnóstico. Em vez de apenas combater o câncer, os profissionais de saúde buscam promover qualidade de vida e oferecer ao paciente a possibilidade de participar ativamente das decisões sobre seu próprio tratamento. Esse novo modelo — centrado na autonomia do paciente — está ganhando força no Brasil e representa uma virada significativa no paradigma tradicional da medicina.

A ruptura com o modelo biomédico tradicional

Durante décadas, o modelo biomédico foi dominante na oncologia: o médico tomava as decisões com base em evidências clínicas, e o paciente tinha um papel mais passivo. Contudo, com o aumento da sobrevida em diversos tipos de câncer e a complexificação dos tratamentos, esse modelo começou a mostrar suas limitações. O cuidado centrado apenas na doença desconsidera aspectos emocionais, sociais e psicológicos do paciente. A nova abordagem reconhece o indivíduo como um todo — alguém com valores, crenças e preferências que devem ser respeitados ao longo da jornada oncológica.

O que é autonomia do paciente na oncologia?

Autonomia, no contexto médico, é o direito do paciente de tomar decisões informadas sobre seu tratamento. Isso significa entender claramente seu diagnóstico, as opções terapêuticas disponíveis, os riscos e benefícios de cada uma, e então participar ativamente da escolha do caminho a seguir. Na oncologia, esse conceito é especialmente relevante. As decisões muitas vezes envolvem escolhas difíceis — como optar por um tratamento agressivo com chances limitadas de sucesso ou priorizar cuidados paliativos focados no bem-estar. “A autonomia não é apenas o direito de dizer sim ou não a um tratamento, mas de ser ouvido e ter suas necessidades consideradas em todas as fases da doença”, destaca a oncologista clínica Dra. Ana Lúcia Nunes, da ABRALE.

Qualidade de vida: um pilar inseparável da autonomia

Qualidade de vida não é um luxo, mas uma necessidade. O tratamento do câncer pode envolver cirurgias, quimioterapia, radioterapia e outras intervenções que impactam diretamente o cotidiano dos pacientes. Lidar com efeitos colaterais, alterações no corpo, limitações físicas e o medo constante da progressão da doença exige uma abordagem mais humanizada. Por isso, a discussão sobre qualidade de vida deixou de ser marginal para se tornar central. Programas de cuidados paliativos precoces, reabilitação oncológica, apoio psicológico e acolhimento familiar passaram a ser incorporados em centros de excelência no país.

Comunicação como base para decisões compartilhadas

A relação médico-paciente está no cerne dessa mudança. Profissionais de saúde têm sido capacitados para melhorar sua escuta ativa, usar uma linguagem mais acessível e criar um ambiente de confiança mútua. Decisões compartilhadas (ou “shared decision making”) são práticas cada vez mais adotadas, principalmente em casos de câncer em estágio avançado. Elas permitem que os pacientes compreendam todas as possibilidades, expressem seus desejos e tenham suas preferências consideradas com seriedade.

Os desafios da implementação no SUS

Apesar dos avanços em centros privados e universitários, implementar esse novo modelo de atenção oncológica no Sistema Único de Saúde (SUS) ainda é um desafio. O volume elevado de pacientes, a limitação de tempo nas consultas e a carência de equipes multidisciplinares dificultam a prática de uma medicina centrada no paciente. Ainda assim, algumas iniciativas têm buscado capacitar profissionais da rede pública com treinamentos sobre cuidados paliativos, comunicação empática e humanização do atendimento.

Cuidados paliativos não significam desistência

É comum que a palavra “paliativo” seja interpretada como sinônimo de fim da linha. No entanto, os cuidados paliativos visam oferecer alívio dos sintomas, suporte emocional e espiritual, além de melhorar a qualidade de vida tanto do paciente quanto da família — desde o diagnóstico. Esse tipo de cuidado é essencial mesmo quando o tratamento curativo ainda está em andamento. Estudos apontam que pacientes que recebem cuidados paliativos precoces têm menos internações, sofrem menos efeitos colaterais e, em alguns casos, até vivem mais.

O papel da família na construção da autonomia

Robo assistente Farmacia Delivery Online Saude e Tecnologia A participação da família é outro ponto essencial na jornada do paciente. Muitas vezes, são os familiares que acompanham de perto as consultas, ajudam nas decisões e oferecem suporte emocional. No entanto, também é preciso encontrar o equilíbrio entre proteger o paciente e permitir que ele tenha voz ativa. Profissionais bem treinados ajudam a alinhar expectativas e a garantir que os desejos do paciente estejam sempre em primeiro lugar.

Caminhos para o futuro

O avanço da medicina de precisão, a incorporação de inteligência artificial e o uso de tecnologias como a telessaúde também têm o potencial de fortalecer a autonomia dos pacientes. Com mais acesso à informação, exames personalizados e monitoramento remoto, o paciente tem mais controle sobre seu tratamento e pode tomar decisões mais conscientes. Além disso, a inserção de protocolos de cuidados baseados em valor (Value-Based Healthcare) está ganhando força no Brasil. Esses modelos valorizam desfechos que realmente importam ao paciente, como bem-estar, funcionalidade e participação social, além de apenas indicadores clínicos tradicionais.

Considerações finais

O cuidado oncológico está mudando, e essa mudança é, antes de tudo, uma escolha ética. Promover autonomia e qualidade de vida não significa abrir mão da ciência, mas aliar conhecimento técnico à sensibilidade humana. Significa reconhecer que o paciente é mais do que um corpo a ser tratado: é uma pessoa com história, valores e desejos. E ao ouvir essa pessoa, a oncologia se torna mais justa, eficaz e humana.

Fontes:
INCA;
Futuro da Saúde;
ABRALE;
SBMO.

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