O impacto da jornada do paciente com câncer na vida real
Receber o diagnóstico de câncer é, para muitos, um divisor de águas. Mas tão desafiador quanto a notícia em si é o caminho que se segue: marcar exames, acessar especialistas, compreender o tratamento, lidar com efeitos colaterais e manter a esperança. Essa trajetória, conhecida como jornada do paciente com câncer, precisa ser mais eficiente, acolhedora e tecnológica.
No Brasil, o sistema ainda enfrenta inúmeros gargalos: desde a demora no diagnóstico até o acesso limitado a terapias de ponta. A boa notícia é que novas estratégias — apoiadas em inovação, parcerias e políticas públicas — estão sendo desenvolvidas para transformar essa realidade.
Onde começam os problemas: diagnóstico tardio e acesso desigual
De acordo com o INCA, grande parte dos casos de câncer no país é identificada em estágios avançados. Isso se deve, em parte, à baixa cobertura de exames de rastreamento e à dificuldade em encontrar especialistas oncológicos nas regiões mais afastadas dos grandes centros.
Além disso, o acesso a tratamentos inovadores, como terapias-alvo e imunoterapias, ainda é restrito ao setor privado ou a instituições filantrópicas de referência.
Essa desigualdade não é apenas geográfica, mas também socioeconômica. Pacientes que dependem exclusivamente do SUS muitas vezes enfrentam filas, desinformação e estruturas de cuidado fragmentadas.
Soluções em curso: tecnologia e modelos de cuidado centrados no paciente
A transformação da jornada do paciente com câncer não depende apenas de novos medicamentos, mas de um novo olhar sobre o cuidado como um todo.
Entre as soluções que estão sendo adotadas com sucesso, destacam-se:
1. Plataformas digitais de rastreamento e agendamento
Ferramentas digitais que organizam a linha de cuidado do paciente, facilitando o acesso a exames, resultados e encaminhamentos. Algumas prefeituras e estados já implementaram sistemas que integram dados do paciente, reduzindo o tempo entre a suspeita e o diagnóstico confirmado.
2. Inteligência artificial na oncologia
Hospitais como o Sírio-Libanês e o A.C. Camargo já utilizam algoritmos para auxiliar na escolha do tratamento ideal com base no tipo de tumor e histórico do paciente. Isso acelera decisões e melhora os desfechos clínicos.
3. Programas de navegação do paciente
Profissionais especializados acompanham os pacientes em cada etapa, oferecendo orientações sobre exames, tratamentos, direitos e apoio psicológico. Estudos mostram que esse tipo de suporte reduz a evasão e aumenta a adesão ao tratamento.
Parcerias para democratizar o acesso
Projetos como o desenvolvido pelo Hospital Israelita Albert Einstein em parceria com o Ministério da Saúde, através do PROADI-SUS, são um exemplo de como o setor público pode se beneficiar da experiência da iniciativa privada e filantrópica.
Esses programas têm como metas:
Capacitar equipes de atenção primária em oncologia;
Criar linhas de cuidado padronizadas;
Avaliar o impacto real das novas tecnologias no SUS;
Apoiar a tomada de decisão para incorporação de medicamentos inovadores.
Incorporando inovação sem perder a equidade
A medicina de precisão e a imunoterapia representam um novo paradigma no tratamento do câncer. Elas não apenas aumentam as taxas de resposta, como também reduzem os efeitos adversos e melhoram a qualidade de vida dos pacientes.
Contudo, os processos de incorporação dessas terapias no SUS ainda são lentos e burocráticos. Após a aprovação pela Anvisa, medicamentos precisam passar por avaliação de custo-efetividade pela Conitec — o que pode levar anos.
Soluções propostas por especialistas incluem:
Avaliação mais ágil e contínua de tecnologias;
Modelos de reembolso por desempenho;
Parcerias de risco compartilhado com laboratórios.
Esses mecanismos podem ajudar a tornar mais acessíveis as inovações que realmente fazem diferença na jornada do paciente com câncer.
Humanização do cuidado: a inovação que vem do coração
Tecnologia e infraestrutura são fundamentais, mas a humanização continua sendo o diferencial mais potente na jornada do paciente com câncer. Isso envolve escuta ativa, empatia, respeito às decisões do paciente e suporte integral — físico, emocional, social e espiritual.
Hospitais que adotaram práticas de cuidado humanizado relatam maior satisfação dos pacientes, menores taxas de abandono do tratamento e melhor adesão aos protocolos clínicos.
O papel da sociedade civil e das políticas públicas
Leis como a dos 30 Dias (13.896/19) e dos 60 Dias (12.732/12) têm como objetivo acelerar diagnósticos e tratamentos. No entanto, sua efetividade depende de infraestrutura, governança local e monitoramento.
Organizações como o Instituto Oncoguia e o Todos Juntos Contra o Câncer têm atuado fortemente na pressão por melhorias, promovendo campanhas de educação e acolhimento.
Conclusão
Redesenhar a jornada do paciente com câncer no Brasil é um desafio coletivo que exige coragem, planejamento e empatia. A inovação tecnológica tem um papel essencial, mas ela precisa vir acompanhada de acesso, equidade e compromisso com o ser humano em sua totalidade.
A boa notícia é que o caminho já começou a ser trilhado — e, se for bem conduzido, poderá transformar para melhor a realidade de milhões de brasileiros.
Fontes:
INCA;
Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica;
Futuro da Saúde;
Instituto Oncoguia.